O Nordeste é a região que lidera o ranking de lares chefiados por mulheres no Brasil. Em 53% das residências nordestinas, elas são as principais responsáveis pela família, segundo dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, do IBGE. Esse fenômeno reflete tanto o empoderamento feminino quanto a desigualdade social que afeta as mulheres, especialmente as negras e pobres.
As mulheres nordestinas enfrentam duplos desafios: o machismo e a xenofobia. A empresária Daniela Lacerda, dona de uma rede de supermercados em Feira de Santana, na Bahia, sabe bem disso. Ela conta que sofre preconceito por ser jovem, mulher e nordestina. “O sotaquezinho, às vezes, incomoda”, diz. Mas ela não se intimida: “meu oxente ainda vai ultrapassar muitas barreiras”.
Outra mulher que se destaca nos negócios é a empresária Siomara Damasceno. Ela é dona
de uma loja de materiais de construção e se tornou consultora a partir de vídeos que faz sobre o assunto para a internet. Ela também é a cabeça da família, formada pelo marido e o filho. Ela diz que se preocupa com detalhes que os homens não percebem. “Eu acho que quando o homem é chefe da família, não passa pela cabeça dele se a escola do filho está ensinando o que realmente prometeu no dia da matrícula”, exemplifica.
Outro recorte elaborado pelo Sebrae a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), revela que mais da metade das empreendedoras brasileiras (51%) desempenham a posição de “chefe de domicílio”. É o maior nível em seis anos, resultado de um crescimento de 10 pontos percentuais no período. Em 2016, 41% das empreendedoras eram as principais responsáveis pelo sustento da casa.
Pesquisadora alerta para a feminilização da pobreza
Mas nem todas as mulheres que lideram seus lares têm sucesso financeiro. A economista e pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Ana Luiza de Holanda Barbosa, alerta para a feminilização da pobreza. “Elas ganham menos que os homens, estão em empregos mais vulneráveis e quais são as implicações disso para essas famílias? Entre as famílias pobres, você tem uma maioria chefiada por mulheres”, afirma.
A aposentada Maria das Dores também criou os três filhos sozinha, após o divórcio. Trabalhando de segunda a domingo, ela ainda conseguiu construir uma casa, mesmo com o dinheiro apertado. E reflete, ao lembrar o que passou: “eu sei que fiz tudo que podia e mais um pouco, mas se uma pessoa sozinha faz o que fiz, imagina se eu tivesse mais suporte financeiro”.
Para Renata Malheiros, coordenadora nacional de Empreendedorismo Feminino do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), as mulheres têm que se destacar em competências técnicas e socioemocionais, o que nem sempre é exigido dos homens. “Ainda vemos muitos olhares e conversas que são, na verdade, vieses inconscientes baseados em estereótipos de gênero”, afirma.
A tabela abaixo mostra a taxa de desocupação do Brasil, de acordo com os dados da PNAD do IBGE.
| Região | Taxa de desocupação no 2º trimestre de 2023 (%) | Variação em relação ao 1º trimestre de 2023 (p.p.) | Variação em relação ao 2º trimestre de 2022 (p.p.) |
|---|---|---|---|
| Norte | 9,5 | -0,8 | -1,0 |
| Nordeste | 11,3 | -0,7 | -1,4 |
| Sudeste | 7,6 | -0,9 | -1,4 |
| Sul | 4,7 | -0,6 | -0,9 |
| Centro-Oeste | 7,5 | -0,8 | -1,2 |
| Brasil | 8,0 | -0,8 | -1,3 |
Necessidade de políticas públicas
Débora Thomé, cientista política e pesquisadora do Centro de Política e Economia do Setor Público (Cepesp), da Fundação Getulio Vargas, defende que as mulheres chefes de família da linha da pobreza são um grupo ultra prioritário para se pensar em políticas públicas. “Quando você observa esse grupo, a maior parte das pessoas é de mães, pretas e pardas, que cuidam sozinhas de seus filhos, que não têm com quem compartilhar a renda”, diz.
Todas as personagens deste texto estão no documentário Mulheres à frente, da TV Brasil. Você pode conferir o programa na íntegra no vídeo abaixo.
